Comecei por observá-la,
perscrutei a sua arquitetura, e deixei-me seduzir pelo enfeite da sua coroa.
Atrevo-me a convidar o leitor
a viajar comigo ao interior de uma romã.
Pintura de Celestino de Oliveira
Primeiro atravessemos a casca
dura, que protege ciosamente o seu conteúdo da hostilidade exterior.
Cada grão cor rubi, contem em
si uma semente, génese de toda uma romanzeira por nascer. Embora individualmente frágeis, os grãos unem-se
na diferença porquanto as alvéolas
brancas os separam, agregam, e formam
câmaras coerentes que reticulam, conferem rigidez e protegem o conjunto.
Permitam-me, por uns
instantes, a ousadia de considerar cada um de nós, portugueses, como um grão de romã, onde
nos pressentimos protegidos pela rigidez da casca, e diferentes uns dos outros
nos advertimos iguais. As estruturas arquitetónicas adjacentes, longe de nos
separar, estabilizam uma vivência comum. À nossa fragilidade individual opõe-se
a génese do que nos une, à semente de uma irmandade perpétuamente renascida.
Mas Portugal não é romã sadia;
a casca tem fendas e antros de podridão que vão contagiando o seu interior. Aqui há alguns grãos rubi, numerosos anémicos
esbranquiçados, e a maioria ficaram castanhos, moribundos. As estruturas que
eram supostas nos proteger pactuaram com as agressões exteriores.
Portugal, era uma vez uma
Romã...
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